(IMAGEM RETIRADA DAQUI)
Há uns largos 16 anos encontrei-me com Al
Berto, numa estante de livraria, ali estava ele abandonado ao desatino de
tantos outros, numa prega bolorenta de deposição, estereotipo das livrarias das
grandes superfícies, de cuidado pomposo apenas para top’s de vendas e aquela
coisa a que chamam de literatura new age. Um tanto ao quanto a imagem do mundo
de hoje, o vende rápido e o consiga você mesmo, virámos depósitos de clichés baratos.
Mas a forma como está organizada uma livraria espelha a imagem do Homem Moderno,
um sumptuoso papel de embrulho, em que a sobreposição requer árdua labuta.
O fascínio deu-se logo nesse primeiro embate
dedilhado onde em surdina balbuciava…
A escrita é
a minha primeira morada de silêncio
a segunda
irrompe do corpo movendo-se por trás das palavras
extensas
praias vazias onde o mar nunca chegou
deserto onde
os dedos murmuram o último crime
escrever-te
continuamente... areia e mais areia
construindo no sangue altíssimas
paredes de nada
esta paixão pelos objectos que
guardaste
esta
pele-memória exalando não sei que desastre
a língua de limos
espalhávamos sementes de cicuta pelo nevoeiro dos sonhos
as manhãs chegavam como um gemido
estelar
e eu perseguia teu rasto de esperma à beira-mar
outros corpos de salsugem atravessam
o silêncio
desta morada erguida na precária
saliva do crepúsculo
Hoje, 16
anos volvidos sobre esse abismal encontro, não recuperei ainda destreza de
forças para penetrar no Medo de Al Berto, dele li tudo, ou quase tudo, e em cada
virar de página fomos discutindo, como dois velhos sentados no jardim, verdades
e sentidos, géneros e metamorfoses, opulências e mortes. Mas o Medo mantém-se, impoluto
ao meu dedilhar sobreagudo.
Quem
sabe num até já, eu acompanho o gigante, que após a sobrecapa se revelará menor
que um pigmeu, e juntos irromperemos nesse Medo…
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