30 de novembro de 2015

QUID.

Imagem fotografada e editada pela gestora do Blog - Lisboa, Outubro de 2015.


"Quem, ao ler a história, não se arrepia horrorizado com os bárbaros e inúteis tormentos que os homens, que se diziam sábios, friamente inventaram e puseram em prática?"


Cesare Beccaria in 'Dei delitti e delle pene'.

13 de novembro de 2015

SCRIPTA

(Imagem fotografada e editada pela Gestora do Blog)


O escritor não pode ser confinado a um mero contador de estórias, a um embelezador das mundanárias liberalidades. Nem pode ser encarcerado na veleidade oblíqua da palavra, porque isso redunda-o a um mero escrevinhador de pasquins. O verdadeiro escritor deve ser livre, no todo da liberdade que é, no todo da responsabilidade de ser, desnudo de formas e preceitos.
Camus frisava que o sofrimento de um homem deve tirar o escritor do seu exílio. Assim é de facto. A função de escritor, mais do que a criação é a entrega do homem ao homem. Não faz sentido que a escrita seja um silogismo de narcisismo espelhado, porque todo o ser humano se vê ante o espelho e isso de nada lhe serve na procura do desconhecido que é.
É função do escritor criar nesse oceano bravio portos de abrigo onde se possam ancorar os navios transviados. E é no sofrimento do homem que ele adquire o cinzel com que há-de bulir o caminho de encontro. Aquele que tomou para si este ofício jamais poderá olvidar que a sua pena tem um só fim, chegar ao homem pela mão do homem.


9 de outubro de 2015

A CERIMÓNIA DO ADEUS

(IMAGEM RETIRADA DAQUI - SIMONE DE BEAUVOIR E JEAN-PAUL SARTRE)

Está uma límpida manhã de outono, são oito horas e já o raiar dourado do sol cobre as terras cortilhadas de orvalho, ante este cenário o meu pensamento escorre para A Cerimónia do Adeus, de Simone de Beauvoir.

Por regra, livro algum, uma vez terminada a sua leitura, me leva no imediato a escrever, e muito menos me leva a tecer anotações em folha, mas as regras, quando nossas têm esse condão de quebra, que leva a um espraiar de limites e horizontes. O que irei aqui dedilhar não constitui uma crítica, nem a Simone de Beauvoir, nem ao resultado da sua pena, que em bom rigor da verdade pouco conheço, deixá-la-ei para os profissionais que sugam até ao tutano a existência das linhas.

É certo que um Adeus não é fácil, seja ele esperado ou não, mas a sua letalidade deixa sempre marcas e cabe a cada um traçar o rumo da sua cicatrização. Simone no prefácio do livro escreve: “É uma coisa que não se pode dizer, que não se pode escrever, que não se pode pensar; é uma coisa que se vive e é tudo.”. Mas esse tudo é ao fim das contas um nada. Um nada que preenche um todo, ou por outro lado, preenche um vazio que é um todo.

Este livro no qual se traduzem os últimos dez anos de vida de Sartre, á lupa de Simone, demorou mais de dois meses a ser lido, e tem apenas 252 páginas… mas não foi o gosto ou o desgosto das suas folhas que alongaram a sua leitura, antes foi a minha disposição para ele e confesso que o excesso de detalhes históricos prolongou o seu término, talqualmente, como a ausência de uma Simone física feita de carne, nervos e ossos. O que encontrei foi uma intelectual refugiada na razão, ausente de si e totalmente ansiosa pela tragédia de um adeus, que sabia ser antes de tudo o demais, preenchido por sentidos.

O intelectual sofre acima de tudo. Há nele um nervosismo inato e um constante apego e desapego do corpo. Um apego porque é este que lhe pode garantir uma labuta continua, uma imortalidade instantânea, mas o desapego é-lhe necessário porque é na razão que ele se encontra e apreende, e o corpo atrapalha-o. E foi este fatalismo que encontrei na pena de Simone, um Sartre até 1970 livre, desimpedido de corpo que percorreu até ao excesso toda a fervura do seu intelectualismo, e um outro que a partir da década de setenta até há de oitenta ficou encarcerado nas suas maleitas. A degradação do homem físico é inevitável, mas o intelectual não o aceita. Por isso A Cerimónia do Adeus, não é um adeus a Sartre é um adeus ao intelectual que foi e que o corpo não permitiu continuar a ser na sua óptica acutilada.

Não é Sartre quem mais sofre com as suas privações físicas, e por conseguinte, com a sua degradação, mas sim Simone, porque o seu apego nunca foi ao Sartre físico, ao Sartre homem, foi sempre e até final ao Sartre intelectual. E como é que se diz adeus ao génio quando o homem ainda vive? Como é que vivemos nos outros, o que é igualmente o nosso fim?

Por isso escreve Simone no seu diário em 1970, “ Este estúdio, tão alegre desde o meu regresso, mudou de cor. A bela alcatifa cor de rato lembra um luto. É assim que será preciso viver, no melhor dos casos, ainda com felicidade e alguns momentos de alegria, mas com a ameaça suspensa sobre nós, com a vida posta entre parênteses.” E é aqui que começa a longa cerimónia do adeus de Simone, mas o Sartre homem viveu por mais 10 anos.

E coloca-se a questão, a quem serviu esta cerimónia? A quem serviu este luto antecipado? A Simone? A Sartre? Ao intelectual? De todo o modo, esta cerimónia não é um adeus a Sartre, Homem no seu todo, mas um adeus à ambiguidade da esperança e do infortúnio da intelectualidade.


20 de setembro de 2015

VÍVIDO



IMAGENS FOTOGRAFADAS E EDITADAS PELA GESTORA DO BLOGUE - LISBOA E BRAGA - AGOSTO E SETEMBRO DE 2015


Fotografar é retirar do tempo mais que a imagem, é um furto ao vazio, um clique sempiterno de sentidos.








20 de julho de 2015

TORNA-VIAGEM

IMAGEM FOTOGRAFADA E EDITADA PELA GESTORA DO BLOG - VILA FLOR - MÊS DE JUNHO DO ANO DE 2015


É imenso este cheiro de memória que me leva a ti... ao afago do teu sorriso, à nudez do sentir, a essas  mãos rudes e fortes, bóias no caos da tempestade... regressarei sempre a estas cinzas frescas de um passado que foi hoje, infância que herdei em ti mais que a vida, o completo Amor. Que gritem os deuses se ao acaso se distraírem porque viverás para todo sempre aqui.


19 de julho de 2015

CONTRAFORTE

IMAGEM FOTOGRAFADA E EDITADA PELA GESTORA DO BLOG - NISA - MÊS DE JUNHO DO ANO DE 2015

Afirmar contra os outros não é o mesmo que nos afirmarmos...
Que mania essa de se querer suicidar, memórias!
Bom Homem! Memórias!
Sangue quente, primitivo e vivo.
Um rosto, um abraço e o mistério do toque.
Pedaços vÍvidos de eternidade.
É este, Homem, o teu cerne.
Memórias, apenas, memórias...
Pedaços teus despojados de deuses.

16 de julho de 2015

CENTÍPEDA

IMAGEM FOTOGRAFADA E EDITADA PELA GESTORA DO BLOG - LISBOA - ANO DE 2012.


Cerne, questão das questões
Medo e angústia, filtro de ar
Que respiras e depauperas
                               - Aniquilações

Razão, prensa de demanda
Sobressalto perene e frio
Raia de verdade entre o areeiro
                                     - metafísica


12 de julho de 2015

É A VÉSPERA DE NÃO PARTIR NUNCA!

IMAGEM FOTOGRAFADA E EDITADA PELA GESTORA DO BLOG - CASA FERNANDO PESSOA  - MAIO DO ANO DE 2015


Na véspera de não partir nunca
Ao menos não há que arrumar malas
Nem que fazer planos em papel
Com acompanhamento involuntário de esquecimentos,
Para partir ainda livre no dia seguinte.
Não há que fazer nada
Na véspera de não partir nunca.
Grande sossego de já não haver sequer de que ter sossego!
Grande tranquilidade a que nem sabe encolher ombros
Por isto tudo, ter pensado o tudo
É o ter chegado deliberadamente a nada.
Grande alegria de não ter precisão de ser alegre,
Como uma oportunidade virada do avesso.
Há quantas vezes vivo
A vida vegetativa do pensamento!
Todos os dias sine linea
Sossego, sim, sossego…
Grande tranquilidade…
Que repouso, depois de tantas viagens, físicas e psíquicas!
Que grande prazer olhar para as malas fitanto como para nada!
Dormita, alma, dormita!
Aproveita, dormita!
Dormita!
É pouco o tempo que tens! Dormita!
É a véspera de não partir nunca!


Obras completas de Fernando Pessoa  Poesias de Álvaro de Campos – Pág. 62 – Edições Ática – Novembro de 1986.

11 de julho de 2015

COTEJO

IMAGEM FOTOGRAFADA E EDITADA PELA GESTORA DO BLOG - ROSSIO ANO DE 2014

Há uma razão simples porque nunca prometo o "para sempre", é que o "para sempre" nunca foi meu, e portanto, seria a ilusória promessa de algo que nunca esteve na minha mão. Convenhamos, já coexistem sobejamente cegas ilusões nos olhos destes homens para que se lhe tenha de acrescentar mais uma.