23 de outubro de 2012

PALAVRAS

(IMAGEM RETIRADA DAQUI)
 
 
"As PALAVRAS serão sempre mais do que o que eu sou, mas elas também nunca serão tudo aquilo que eu sou. Sinto-me como a água que, cristalina pousa na concha das mãos, mas que ao ser apertada se esvai por entre os dedos. É assim que eu amo a liberdade de estar com os outros.” - José Manuel Rodrigues Alves in “Palavras”.
  
Tantas são as formas que podemos desenhar com as palavras, tantos os silogismos que podemos construir com elas, outros tantos, deixaremos partir por entre elas.
 
As palavras, não somos nós e no entanto, é com elas e nelas que existimos, que não se confunda a liberdade de uma palavra com a sua, própria, liberdade.
 
Que nunca se aprisione pela palavra, porque a palavra que foi munida desse intento, é palavra que regressa sozinha.
 
As palavras podem e devem ser fortes, mas nunca rudes; podem e devem ser simples, mas nunca vulgares; podem e devem ser delicadas, mas nunca frágeis.
 
Em cada palavra há o encontro de um todo, e as minhas palavras são as tuas palavras, mesmo que nunca as sintas como eu.
 
No fim, todos nós unidos pelas palavras, somos e seremos sempre mais que elas, esse é o reduto da Liberdade do Homem.

10 de outubro de 2012

HÓSTIAS À PÁGINA BRANCA.

(IMAGEM RETIRADA DAQUI)
 
 
Que tortura! Criarem-se conjugações perfeitas de palavras, traduções exímias de ideias, alinhamentos bussolares perfeitos, todos eles a fervilharem na mente em busca de voo, e no súbito encontro dessa página branca, impoluta rainha, são estilhaçados sem dó nem piedade, num vestal vazio… Mortífera!
Ao princípio era o VERBO, assim escrevias tu Vergílio para expor a dolorosa deploração desse branco. Ante o vazio o Homem recua, teme e reza, mesmo que agnóstico de deuses, como te compreendo agora… E de pouco me valerá confessar que logo após a última conversa, neguei-te até ao fim! Havia sempre um contraponto a retardar a lógica aceitação, o pupilo travessa por vezes do mestre, pronto!
Mas ela impôs-se, grave e desdenhosa para afincar o sofrimento dessa tradução que se esgueirou de fininho, entre a ponta da pena e a nudez do corpo. As palavras ferem como balas, na ausência de sentidos a lhes dar. Ah… nem os desabafos a demovem! Cruenta!
Retorno até ti em busca de bálsamo, mas… caramba! Tu encontras sempre forma de me inquietar… Esconjuro-te! Por vezes não sobressai mal algum ao mundo se o não pensarmos, se o não existirmos! Mas tu regressas, sibilante e firme no teu professoral debate, já precavido e de ditado em punho arremessas, sem ele o não somos. Como, mas como, ó deuses, traduzi-lo ante a véstia solitude do branco?
Falas-me de coragem, como se ela fosse a mãe que nos carrega no regaço, e extremosa liberta-nos á porta da última morada. Não vês que isto é tortura! Quedar-me assim, sem nada ante a opacidade desse branco desnudo? Pois que sim, aceito, que Homem não é um nada, mas aceita-me a mim também quanto te digo que, por muito escrito que ele seja, não deixará de conter em si mesmo o vazio. Escrevê-lo? Não, o pontilhar do branco não era para ele, talvez para um poema que matuta há largos dias, feito e desfeito mil vezes, e hoje tinha-o o pronto para o prelo… mas ela, de tão branca que era, matou-o!
Chega! Em vez de um, dois, três e acção… escrevo: um, dois, três e fim! Hóstias à página branca, que me calou por hoje!


8 de outubro de 2012

GRAMPO

(IMAGEM FOTOGRAFADA E TRABALHADA PELA GESTORA DO BLOG)
 
 
Deixa acalmar o medo e respira ao céu que arde
Ante um horizonte que se quedou!
Tudo… tudo de nada, de inexistente, de vazio!
 
Exulta a rota de mundo vergada ao jugo,
E degusta a parábola de luz…
 
Entreabre a quina na mesma erva,
Que consume os lémures e tacteia
A vontade de aferrar… talante de existência.
 
E em áspera surdina inala Confúcio.
Sente em pele, o toque fendido, contuso.
 
E venial, decompõe em mel o cheiro biliar.
Em uno azul murmura a véspida premência!
Ser grampo sem perfil… liana forma de ser que nunca acaba!
 
Levada de estrume premido, enfeite de escala.
Mal de fundo que se entala, ante a saia natal.


7 de outubro de 2012

ESDRUXULARIA

(COLOSSO - FRANCISCO DE GOYA)


Singularidades de crepúsculo feito manhã

A razão é depreda na sua lógica vespertina

A ânsia do ser trespassa as grilhetas férreas da alma

Como jugo descarado no certeza do ter

Dizem que o tempo é isso, inconstância nebulosa



O Poeta é fecundo no tresmalhar das palavras

Como se elas fossem Homem

Deus perdido no limbo da veleidade

Verdade dispersa nas malhas do corporal

Dizem que o sentido é isso, notas fendidas na pele



Espadas esculpidas de suor, sangue e lágrimas

Como se tudo fosse forjado a preceito

E os ossos não fossem mais que puzzle

Peças arrematadas a contento

Dizem que a vida é isso, fornalha de retalhos



Mas a lógica da razão também fere

Nas fissuras incontroláveis do pensamento

O sentido é feito aço que se quebra

Quando o gelo do real o envolve

Dizem que a verdade é isso, controlo absoluto do sopro



Dizem porque dizem... sem tempo lógico de viver

Sem razão de sentir as palavras que dizem.

3 de outubro de 2012

ENCONTRA-ME

(Imagem fotografada e trabalhada pela gestora do blog)
 
 
Encontra-me. Que se me quedaram as forças para te procurar.
Neste labirinto febril e oco, o espaço é uma linha vertical.
Restolham passos por aí em diante, como se o som
Fosse sinal de uma qualquer existência desconexa.
 
Encontra-me. Que ante estes olhos cegos, as imagens partem.
Como neve num manto seco, réstia de gota no oceano árido.
Sinopse de encontros e desencontros, metáfora!
 
Encontra-me. Talvez num, talvez em dois pontos de demanda.
Contrapassos desta desregrada dança de um nada
Entre dois entreactos de nostalgia, quiçá velha solitude…
Quironomia onde no desgaste, os gestos calam palavras.