Que
tortura! Criarem-se conjugações perfeitas de palavras, traduções exímias de ideias,
alinhamentos bussolares perfeitos, todos eles a fervilharem na mente em busca
de voo, e no súbito encontro dessa página branca, impoluta rainha, são estilhaçados
sem dó nem piedade, num vestal vazio… Mortífera!
Ao princípio
era o VERBO, assim escrevias tu Vergílio para expor a dolorosa deploração desse
branco. Ante o vazio o Homem recua, teme e reza, mesmo que agnóstico de deuses,
como te compreendo agora… E de pouco me valerá confessar que logo após a última
conversa, neguei-te até ao fim! Havia sempre um contraponto a retardar a lógica
aceitação, o pupilo travessa por vezes do mestre, pronto!
Mas
ela impôs-se, grave e desdenhosa para afincar o sofrimento dessa tradução que
se esgueirou de fininho, entre a ponta da pena e a nudez do corpo. As palavras
ferem como balas, na ausência de sentidos a lhes dar. Ah… nem os desabafos a
demovem! Cruenta!
Retorno
até ti em busca de bálsamo, mas… caramba! Tu encontras sempre forma de me
inquietar… Esconjuro-te! Por vezes não sobressai mal algum ao mundo se o não
pensarmos, se o não existirmos! Mas tu regressas, sibilante e firme no teu
professoral debate, já precavido e de ditado em punho arremessas, sem ele o não
somos. Como, mas como, ó deuses, traduzi-lo ante a véstia solitude do branco?
Falas-me
de coragem, como se ela fosse a mãe que nos carrega no regaço, e extremosa
liberta-nos á porta da última morada. Não vês que isto é tortura! Quedar-me
assim, sem nada ante a opacidade desse branco desnudo? Pois que sim, aceito,
que Homem não é um nada, mas aceita-me a mim também quanto te digo que, por
muito escrito que ele seja, não deixará de conter em si mesmo o vazio.
Escrevê-lo? Não, o pontilhar do branco não era para ele, talvez para um poema
que matuta há largos dias, feito e desfeito mil vezes, e hoje tinha-o o pronto
para o prelo… mas ela, de tão branca que era, matou-o!
Chega!
Em vez de um, dois, três e acção… escrevo: um, dois, três e fim! Hóstias à página
branca, que me calou por hoje!
Sem comentários:
Enviar um comentário