10 de outubro de 2012

HÓSTIAS À PÁGINA BRANCA.

(IMAGEM RETIRADA DAQUI)
 
 
Que tortura! Criarem-se conjugações perfeitas de palavras, traduções exímias de ideias, alinhamentos bussolares perfeitos, todos eles a fervilharem na mente em busca de voo, e no súbito encontro dessa página branca, impoluta rainha, são estilhaçados sem dó nem piedade, num vestal vazio… Mortífera!
Ao princípio era o VERBO, assim escrevias tu Vergílio para expor a dolorosa deploração desse branco. Ante o vazio o Homem recua, teme e reza, mesmo que agnóstico de deuses, como te compreendo agora… E de pouco me valerá confessar que logo após a última conversa, neguei-te até ao fim! Havia sempre um contraponto a retardar a lógica aceitação, o pupilo travessa por vezes do mestre, pronto!
Mas ela impôs-se, grave e desdenhosa para afincar o sofrimento dessa tradução que se esgueirou de fininho, entre a ponta da pena e a nudez do corpo. As palavras ferem como balas, na ausência de sentidos a lhes dar. Ah… nem os desabafos a demovem! Cruenta!
Retorno até ti em busca de bálsamo, mas… caramba! Tu encontras sempre forma de me inquietar… Esconjuro-te! Por vezes não sobressai mal algum ao mundo se o não pensarmos, se o não existirmos! Mas tu regressas, sibilante e firme no teu professoral debate, já precavido e de ditado em punho arremessas, sem ele o não somos. Como, mas como, ó deuses, traduzi-lo ante a véstia solitude do branco?
Falas-me de coragem, como se ela fosse a mãe que nos carrega no regaço, e extremosa liberta-nos á porta da última morada. Não vês que isto é tortura! Quedar-me assim, sem nada ante a opacidade desse branco desnudo? Pois que sim, aceito, que Homem não é um nada, mas aceita-me a mim também quanto te digo que, por muito escrito que ele seja, não deixará de conter em si mesmo o vazio. Escrevê-lo? Não, o pontilhar do branco não era para ele, talvez para um poema que matuta há largos dias, feito e desfeito mil vezes, e hoje tinha-o o pronto para o prelo… mas ela, de tão branca que era, matou-o!
Chega! Em vez de um, dois, três e acção… escrevo: um, dois, três e fim! Hóstias à página branca, que me calou por hoje!


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