28 de janeiro de 2012

O LIVRO




 Dizem que há sempre um livro que marca um escritor, mais que todos os outros, há um que é o seu amparo, porto de abrigo para o qual se foge na hora da tormenta.

O meu é o Poeta Perguntador de Armindo Rodrigues, Antologia organizada e apresentada por José Saramago, da Editorial Caminho, edição de 1979. É o livro da minha vida, sem ele não vivo, tudo nele me apaixona, tudo nele me faz sentir em casa, na minha casa, na minha zona perfeita de conforto, o campo dos meus sonhos, as minhas asas de condor, as garras da minha liberdade...

É o meu companheiro de vida há mais de 20 anos, está velho e gasto de um uso vivido, tem o sal das minhas lágrimas e o suor das minhas mãos, tem o desassossego da minha confrontação, a revolta dos meus sentidos, a serenidade da minha nostalgia, o negrume dos meus fantasmas, a mó das perguntas incontidas…

O Poeta Perguntador, é a inquietação perene do meu ser, não me dá respostas mas fecunda-me de perguntas, não me afaga a dor mas reergue-me das profundezas carbónicas do impossível, do não feito, do não pensado.

Mais do que um livro é a saudação de um existir, eis que estou cá, viva entre poemas, os que escrevi, os que escreverei, os que aprisiono e os que liberto. Mas viva entre as linhas gastas da vida.

Os poemas que deixo são de Armindo Rodrigues, para que se conheça o Poeta Perguntador, o Poeta com que disserto ideias, faço revoluções e desabafo nas horas inconstantes. Os poemas transcritos não se encontram no livro O Poeta Perguntador, porque não posso limitar um Poeta a um só livro, porque não posso limitar a vida de um Homem ao meu amor.

LIBERDADE 

Ser livre é querer ir e ter um rumo
e ir sem medo,
mesmo que sejam vãos os passos.
É pensar e logo
transformar o fumo
do pensamento em braços.
É não ter pão nem vinho,
só ver portas fechadas e pessoas hostis
e arrancar teimosamente do caminho
sonhos de sol
com fúrias de raiz.
É estar atado, amordaçado, em sangue, exausto
e, mesmo assim,
só de pensar gritar
gritar
e só de pensar ir
ir e chegar ao fim.

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UM POEMA DE AMOR PARA DOMINGO

Por ti traço a minha lei.
Em ti cabe a minha vida.
Dos mais amores que amei
tenho a memória esquecida.
Toucam-te rosas a fronte
arfa o chão sob os teu pés.
Não há tão vasto horizonte
que se compare ao que és.
Contigo, sou mais que o mundo.
Sem ti, nem sequer eu sou.
És o meu sonho fecundo,
que o teu em mim fecundou.

Armindo Rodrigues

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